quarta-feira, 11 de junho de 2008



Esta imagem me encanta, e tenho certeza que será inspiradora para todos vocês.
Com carinho
Zizi

4 comentários:

Márcia Ricco disse...

Muito inspiradora! Tanto que me lembrei que numa das visitas à Figueira ( local onde Trigueirinho mantém um centro espiritual) foram exibidos slides com alguns trabalhos do artista e místico russo Nicholas Röerich. Encontrei um site (www.roerich.ru) que contém um museu virtual com mais de 200 pinturas. É Divino!!!
CUIDADO para NÃO ACESSAR o site (www.roerich.org) pois está com vírus!!
O site do museu virtual começa com uma bandeira ( círculo vermelho com três esferas vermelhas dentro em fundo branco) que foi idealizada por Röerich. A proposta era colocar essa bandeira sobre os museus, monumentos históricos, instituições científicas, educacionais e culturais para que fossem protegidos em tempo de guerra e de paz.
Faça uma visita e depois me conta!
Bjs.

fabio nardini disse...

GHERARDO PERINI

Disse-me o Mestre:
- Chegamos ao marco em que as estradas se cruzam, a cerca de duas milhas da Porta do Povo. Estamos tão distantes da Cidade que todos aqueles que partem, carregados de lembranças, ao chegarem aqui já quase se esqueceram de Roma. Porque a memória dos homens semelha os viajantes fatigados que se desfazem das bagagens inúteis a cada pausa do caminho. De tal sorte que acabarão por chegar de mãos vazias, nus, ao local onde devem dormir e, no dia do grande despertar, serão como crianças que nada sabem do ontem. Gherardo, eis o marco. A poeira dos caminhos embranquece as raras árvores que despontam na planície como miliários de Deus; existem, próximo daqui, um cipreste cujas raízes se encontram à flor da terra, e que luta por viver. Há também um albergue, onde as pessoas vão beber. Creio que as mulheres ricas, muito vigiadas, ali vão nos dias de semana, para se entregar aos amantes, e que, aos domingos, as famílias dos operários pobres fazem uma festa ao irem ali comer. Penso assim, Gherardo, porque em todas as partes é o mesmo.
Não irei mais longe, Gherardo. Não te acompanharei além daqui porque o trabalho urge e já sou velho. Sou um velho, Gherardo. Às vezes, quando te queres mostrar mais carinhoso que de hábito, costumas me chamar de pai. Mas não tenho filhos. Nunca encontrei mulher que fosse tão bela quanto as minhas imagens de pedra, uma mulher que conseguisse ficar horas inteiras imóvel, sem falar, como uma coisa necessária que não precisasse de agir para ser, e nos fizesse esquecer que o tempo passa, por sempre ali estar. Uma mulher que se deixasse contemplar sem sorrir, ou sem se envergonhar, por compreender que a beleza é alguma coisa de grave. As mulheres de pedra são mais castas que as outras, e principalmente mais fiéis, embora estéreis. Não há fissura através da qual o prazer possa chegar até elas, o prazer, ou a morte, ou o germe de um filho, razão pela qual são menos frágeis. Às vezes se quebram, e toda a sua beleza permanece contida em cada um dos fragmentos do mármore, como Deus em todas as coisas, mas nada de estranho nelas penetra que lhes possa fazer partir o coração. Os seres imperfeitos agitam-se e se acasalam para se completarem, mas as coisas puramente belas são solitárias como a dor do homem. Gherardo, não tenho filhos. E sei que a maioria dos homens não tem realmente um filho: tem Tito, ou Caio, ou Pietro, mas não é a mesma alegria. Se eu tivesse um filho, não haveria de se parecer com a imagem que dele imaginaria, antes de nascer. Da mesma forma, as estátuas que faço são diferentes daquelas que a princípio havia sonhado. Só Deus se reserva o direito de ser consciente quando cria.
Se fosses meu filho, Gherardo, não te amaria mais por isso, somente, não me teria de perguntar por quê. Toda a minha vida busquei respostas a perguntas, que talvez nem tenham respostas, e talhei o mármore como se a verdade estivesse oculta no coração das pedras, e dispunha cores na pintura das paredes, como se se tratasse de aplicar acordes a um silêncio demasiado grande. Pois tudo se cala, até mesmo nossa alma – ou talvez sejamos nós que não ouvimos.
Parte, pois. Não sou mais tão jovem que possa atribuir importância a esta separação, mesmo quando definitiva. Sei bastante bem que os seres que amamos, e que mais nos amam, nos deixam insensivelmente a cada instante que passa. É dessa forma que se separam de si mesmos. Estás sentado sobre esse marco pensando que ainda estás aqui, mas teu espírito, voltado para o futuro, já não se contém no que era tua vida, e tua ausência principia agora. É bem verdade que compreendo não passar tudo isso de ilusão como tudo o mais, e sei que o futuro não existe. Os homens, que inventaram o tempo, inventaram em seguida a eternidade como um contraste, mas a negação do tempo é tão vã quanto ele próprio. Não há nem passado, nem futuro, mas apenas uma série de presentes sucessivos, um caminho, perpetuamente destruído e recomposto, pelo qual avançamos sem parar. Estás sentado, Gherardo, mas teus pés se apóiam diante de ti sobre o solo com uma espécie de inquietação como se já pressentissem o caminho. Estás vestido com roupas do nosso século que parecerão horrendas, ou simplesmente estranhas, quando nosso século tiver passado, pois as vestes não passam da caricatura do corpo. Vejo-te nu. Tenho o dom de ver, através das vestes, o reflexo do corpo, e é dessa forma, creio, que os santos vêem as almas. Um suplício, quando são feios; quando belos, outro suplício ainda. És belo, Gherardo, dessa beleza frágil que a vida e o tempo assediam por todos os lados, e que acabarão por te tomar, mas neste momento ela é tua, e tua permanecerá sob a abóbada da igreja em que pinto a tua imagem. Mesmo se, um dia, teu espelho te apresentar como um retrato disforme no qual não te ousarás reconhecer, sempre haverá em alguma parte, um reflexo imóvel que se parecerá contigo. E será dessa mesma forma que imobilizarei tua alma.
Já não me amas. Se aceitas ouvir-me durante uma hora inteira, é porque somos indulgentes com aqueles a quem abandonamos. Ligaste-me e agora soltas-me. Não te censuro, Gherardo. O amor de um ser é um presente tão inesperado, tão pouco merecido, que devemos sempre admirar de o não nos tomarem mais cedo. Não me inquieto por aqueles que ainda não conheces, mas para os quais segues agora e que talvez te esperem: aquele que irão conhecer será diferente deste que pensei conhecer, e que imagino amar. Não se possui ninguém (até mesmo os que pecam não chegam a isso) e a arte, que é a única posse verdadeira, busca menos apoderar-se de um ser que recriá-lo. Gherardo, não te equivoques com minhas lágrimas: é melhor que partam aqueles a quem amamos, desde que nos seja lícito chorar por eles. Se ficasses, talvez tua presença, sobrepondo-se, iria enfraquecer a imagem que tenciono dela preservar. Assim como as tuas vestes não passam do invólucro do teu corpo, não és para mim senão o invólucro do outro, aquele que arranquei de ti, e que a ti sobreviverá. Gherardo, já és a partir de agora, menos belo que tu mesmo.
Só possuímos eternamente os amigos a quem abandonamos.

O Tempo Esse Grande Escultor – Marguerite Yourcenar.

Zizi, se nao conhece este texto, espero que goste tanto qto eu.

Enviado por
Fabio Nardini

Patrícia Santos disse...

Fábio, eu gostei muito do texto e a partir dele meu imaginario ficou povoado de imagens, sensações e questionamentos a partir de algumas passagens, como por exemplo:
"Só possuímos eternamente os amigos a quem abandonamos."

Enfim...

Até
Pat

Beto Noia disse...

Muito bonita a imagem do Cristo. Encantadora mesmo.

bjs.